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quarta-feira, 15 de setembro de 2010


Enfrentando a opinião pública

por Ronildo Jesus | foto Retrato3 Estúdio


Sem “papas na língua”, o advogado que defende o goleiro Bruno, do Flamengo, no caso Eliza Samúdio, já foi comparado pela imprensa ao personagem John Milton, do filme O Advogado do Diabo, interpretado por Al Pacino.

Nos últimos dois meses, o sono de Ércio Quaresma Firpe está restrito a duas horas por dia. A sua alimentação tem sido apenas sanduíches de uma cadeia americana de fast food, e em horários inapropriados. Tanto sacrifício tem objetivo bem claro: provar a inocência do goleiro do Flamengo, Bruno Fernandes, suspeito de ter arquitetado a execução de sua ex-amante, Eliza Samúdio.

O advogado recebeu a reportagem da revista Star em seu escritório, em um prédio nas proximidades do Fórum Lafayette, na avenida Augusto de Lima, na região Centro-Sul de Belo Horizonte. Ao perceber que havia se atrasado duas horas, demonstra um certo constrangimento e se desculpa. Depois de tirar o paletó e acomodar-se em uma cadeira, ajeita os óculos Prada em seu rosto e, na primeira oportunidade em que fala sobre o caso Bruno, dispara: "Todos vão ser absolvidos". Depois, vaticina: "Bruno joga a Copa de 2014". Quaresma se declara flamenguista roxo.

Em 20 anos de profissão, Quaresma conhece bem a fama que adquiriu: "A turma por aí brinca dizendo que sou doido, bom e caro". E quem duvida do que este advogado de 46 anos, casado e pai de um filho de oito anos é capaz de fazer, vale a pena colocar as "barbas de molho". Quaresma acumula em seu currículo trabalhos em casos de grande repercussão nacional. O massacre de Eldorado de Carajás e o assassinato da missionária Dorothy Stang, no Pará, são apenas dois exemplos. O advogado também representou a defesa de um dos acusados da chacina em Unaí e atuou no caso da morte do promotor Francisco José Lins do Rego Santos, que ocorreu na capital mineira, em 2002.

Antes de se enveredar pela carreira de advogado criminalista, Quaresma havia sido policial civil durante três anos, onde comandou a primeira greve da instituição, em 1988. Também foi dele a iniciativa de criar o primeiro sindicato de policiais civis do país. Depois de ter sido reprovado em três concursos para delegado, Quaresma deixa a Polícia Civil. "Não fui expulso, pedi para sair", ressalta. O advogado também tentou a carreira política. Candidato a governador, nas eleições de 1994, ele obteve 121.330 votos. "Hoje, seria tranquilamente, ao longo do tempo, deputado estadual ou federal, defendendo a polícia civil. Eu tenho polícia no sangue".

Quaresma afirma que não aceita trabalhar em casos de crime sexual. No entanto, durante sua carreira, representou a defesa de cinco suspeitos deste tipo de crime. "Só os defendi porque tinha convicção absoluta de que os caras eram inocentes", diz o advogado, que venceu em três casos.

Em Eldorado dos Carajás foram 19 cadáveres e seis absolvições

A carreira foi catapultada, de fato, depois que Quaresma foi convidado pelo colega Américo Leal, que atua no Norte do país, a participar da defesa de policiais militares, no caso do massacre de trabalhadores sem-terras em Eldorado dos Carajás, no sul do Pará, em 1996. "Foram 19 cadáveres e encaçapamos seis absolvições".

O estilo de atuar que Quaresma adotou para defender seus clientes começou a ser notado pela ao personagem John Milton, do filme O Advogado do Diabo. Para mim foi um elogio muito imprensa, principalmente a partir desse caso. "Um jornalista da Folha de S.Paulo me comparou grande porque quem interpretou o personagem foi o Al Pacino. Mas se ele me comparou ao John Milton, me comparou ao próprio Diabo", lembra.

Opinião pública influencia para derrota no caso Dorothy Stang

Quaresma seguiu mais uma vez na contramão da opinião pública ao participar da defesa no caso do assassinato da missionária Dorothy Stang, que foi morta com sete tiros, em Anapu, no Pará, em 2005. "Perdemos o caso porque houve muita pressão. Levamos 30 anos" – lembra – "Eu tenho justiça quando os meus reclames são atendidos e tenho justiça quando os meus reclames são afastados e prevalece a tese ministerial. Não posso ficar chorando um mês ou rindo durante um ano, por ter ganhado ou perdido uma causa. Amanhã tem outra causa para eu trabalhar e depois mais outra", pondera.

Outros dois casos emblemáticos em que o advogado atuou foram a defesa de um dos acusados de participar chacina de três fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), em Unaí, em 2004, e da defesa de um dos suspeitos de envolvimento no assassinato do promotor Francisco José Lins do Rego Santos, em Belo Horizonte, em 2002. "Reduzimos a cadeia do nosso cliente de 18 para 12 anos, no caso da morte do promotor. Já no caso de Unaí, não sei porque o meu cliente não está na rua. Os irmãos Mânica estão soltos. Meu cliente está preso porque é pobre", polemiza.

Relacionamento conturbado com juízes, em audiências

Apesar de ter sido comparado ao próprio Diabo, como admitiu, contraditoriamente, são os trechos da Bíblia que Quaresma cita ao iniciar as defesas de seus clientes no júri. Em casos que envolvem uma suposta violência policial, ele vocifera quase que uma página inteira do livro Rota 66, do jornalista Caco Barcellos, que relata a história de pessoas inocentes que foram mortas pela polícia paulista, na década de 1980.

Durante as defesas, Quaresma dá mostras de excentricidade como quebrar em plenário uma garrafa de cerveja para provar que o objeto se transforma em uma arma letal.

Ele também chegou a usar máscara de esqui, conhecidas como "tenerê", para provar que, ao usar o acessório, uma pessoa não poderia ser reconhecida. Outras performances inusitadas são acumuladas nas defesas de Quaresma. Mas, para ele, a mais emblemática foi ter subido na tribuna para dar uma aula de balística e provar que, ao invés homicídio doloso, seu cliente havia cometido homicídio culposo.

No entanto, com a mesma velocidade em que Quaresma ganhou reputação de advogado de rara excelência, vieram os desafetos. "Dois juízes já me mandaram calar a boca no meio de uma audiência", lembra. "Vossa excelência pensa que fala com alguém da sua família?", respondeu, na ponta da língua.

Em outro episódio, Quaresma admitiu a um juiz que "se exercitar a defesa fosse conturbar, assim o faria", ao ter sido acusado de atrapalhar uma audiência, em que seu cliente era mantido algemado. Na época, Quaresma teve voz de prisão decretada pelo juiz por desacato a autoridade. Sem pensar muito, Quaresma retrucou à altura: "Vossa excelência está presa por abuso de autoridade", mas como não poderia sustentar a voz de prisão contra o juiz, solicitou que ele próprio fosse algemado. "Meu cliente, que é pobre, você mantém algemado. A mim, você não tem peito de algemar", disse. Depois do escarcéu armado, o jeito foi recorrer à emissora de televisão e dizer que havia sido preso por um juiz durante uma a audiência. "Ainda não foi concebido um ser humano, que vai exercer a função de juiz ou promotor, e que vai me mandar calar a boca, sem ouvir na medida exata do que eu fui tratado", afirma.

A polícia acendeu os holofotes, no caso Bruno?

Apesar do episódio, Quaresma diz que não precisa aparecer na mídia. No entanto, a sua exposição por causa da atuação na defesa do goleiro Bruno, despertou o interesse de programas de TVs do eixo Rio-São Paulo, como "Mais Você", da TV Globo, apresentado por Ana Maria Braga; "A Tarde é Sua", da Rede TV, apresentado por Sônia Abrão e "Conexão Repórter", do SBT, apresentado por Roberto Cabrini. O advogado também conversou com o jornalista José Luiz Datena, da TV Bandeirantes.

"Algumas pessoas me convidaram para participar de programas de televisão e e, como tenho educação, aceitei. No caso Bruno, quem acendeu os holofotes foi o delegado Édson Moreira (chefe do Departamento de Investigações da Polícia Civil). Eu só tratei de apagá-los", critica Quaresma, que teria sido procurado pela produção do Programa do Jô, da TV Globo, para uma possível participação. "Não sou bobo para não aceitar", avisa.

O embate travado entre o advogado e a Polícia Civil começou logo no início do caso Bruno, quando Quaresma foi à imprensa reclamar que o delegado Édson Moreira não havia permitido a ele o acesso ao inquérito policial. "O efeito provocou a entrada da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB no inquérito policial daquele caso" – lembra – "Eles (delegados) submeteram meus clientes a cinco, dez, quinze horas de inquisição", diz.

Quaresma também se diz irritado com um assistente de um Ministério Público, que, segundo ele, teria plantado uma notícia sobre seu suposto envolvimento com drogas. Para ele, a intenção de seu rival era tomar-lhe o caso. "Ele pediu para ser advogado do Bruno. Disse que eu cheirava cocaína, que era safado, ladrão. O dia dele está guardado. Não é o primeiro advogado que faz isso", acusa.

Com tanta polêmica em sua vida profissional e alguns desafetos declarados, não é difícil adivinhar o quanto Quaresma se preocupa com sua segurança e de sua família. "Já tentaram me matar duas vezes. Tenho um carro cravejado de balas", lembra. Para se prevenir, o advogado diz que vai conseguir porte de arma e avisa. "Se chegarem perto do meu filho, eu mato".

Quem é quem, na defesa do caso Bruno

Durante a entrevista, Quaresma aproveitou também para definir a equipe de advogados que representar os clientes, no Caso Bruno. Além do próprio advogado, que vai defender o goleiro rubro-negro; Dayanne Fernandes vai ser defendida pela advogada Claudineia Calabundi; Fernanda Gomes de Castro, pela advogada Carla Silene; Luiz Henrique Romão, "Macarrão", por Américo Leal e uma banca de advogados do Pará e Amapá; Flávio Caetano de Araújo, por Frederico Ozil e Elenílson Vítor da Silva, pelo advogado Antônio da Costa Rolim.

5 comentários:

  1. Pra mim o Dr. Quaresma é um excelente advogado, tem um perfil muito guerreiro e como não se curva ao frenesi midiático recebe muitas falácias de pessoas e instituições que desconhecem os pormenores dos casos que o exemplar advogado defende.

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  2. E a audiência do dia 17 de setembro - caso Bruno?

    MP pegou o processo no dia 09/09, tem prazo de 15 dias para devolver. Sera que devolve antes do dia da audiência?

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  3. Que bom que não interferiu na data da audiência!

    Só não entendi por que Dr. Quaresma orientou aos réus não falarem nessa audiência do Rio de Janeiro.

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